Tão enigmático ou filosófico quanto o significado do amor, o surgimento desta palavra a fim de traduzir em fonemas o ato de gostar de alguém, se envolver, cuidar ou se deixar afetar por outra pessoa acompanha a humanidade há muitos milênios.

Registros históricos mostram a palavra que identifica o sentimento amor nas antigas escrituras atribuídas a Salomão há mais de 3000 anos.

O Cântico dos Cânticos, que compunha o Velho Testamento trazia um diálogo entre dois jovens apaixonados que começava com o trecho “Beija-me com teus beijos! Tuas carícias são melhores que o vinho!”.

Os versos provocaram polêmica à época entre judeus e cristãos na hora de incluir ou não tais declarações quentes no livro sagrado. Por fim, a versão sofreu algumas adaptações que deixaram o texto mais leve, digamos assim.

Segundo estudiosos de línguas e religiões do Egito antigo, algumas expressões apaixonadas que comparam o corpo do ser amado à frutas, pedras preciosas, ervas ou substâncias doces do tipo ‘lábios de mel”, “olhos de amendoados” vieram deste que é um marco dentre os primeiros textos de amor já registrados pela humanidade.

Estas expressões seriam os ecos de uma tradição poética advindos de 3000 anos atrás.

Com o surgimento do Novo Testamento a palavra amor ganha um significado ainda mais amplo e transcendente quando João diz “Deus é amor”.

Ao ampliar o amor como algo além do sentimento entre homem e mulher, o sublime forma a base de toda religião moderna desde então.

Três palavras que vieram do original grego para amor deram origem à palavra atual.

Com exceção do termo não encontrado no Novo Testamento que vem do deus grego Eros que traz a conotação do amor e paixão, os outros termos que formam o vocábulo amor vieram de philia (amizade), storgé (afeto como o amor fraternal) e ágape (amor sem interesse, aquele que doa sem esperar retribuição).

Em muitos textos antigos a palavra amor era substituída por caridade justamente para ampliar o sentimento além do sentido romântico.

Ainda antes de Cristo, Platão no século IV nos apresentava o termo “amor platônico” em sua obra O Banquete, onde um diálogo montado como uma peça de teatro trazia Eros, a divindade grega para o amor ,apresentado como um anjo que flecharia o coração dos casais apaixonados.

Na obra, outros temas como “almas gêmeas” e “cara metade” aparecem pela primeira vez na cultura Ocidental. Ali, Aristófanes em conversa com Platão menciona recorre a mitologia para explicar tais temas que conotam o impulso amoroso.

Segundo o filósofo, o ser humano seria inicialmente um andrógino de duas cabeças, quatro pernas e quatro braços.

Com medo de que tal criatura ameaçasse o seu poder, Zeus a partiu ao meio criando duas criaturas. Seria por este motivo que o ser humano traria em si a sensação de estar incompleto, sem a sua cara metade ou alma gêmea.

Já para Sócrates que encarava os mitos como simples superstição, o sentimento mais sublime deveria ser entendido apenas através da visão de Platão: o amor deve ser o afeto elevado a um plano ideal, aquele que transcende o físico, onde o contato físico não é tido como prioridade, porém esta ligação tangível, através do tato, não deve ser descartada.

Muita gente pensa que quando falamos em Amor Platônico, falamos de um amor impossível ou aquele em que duas pessoas jamais desenvolveriam um amor com contato físico, mas este entendimento é equivocado.

Na época de Platão, o entendimento de corpo e alma era de um ser só, então onde houvesse amor, haveria inteligência e o toque de maneira sublime e transcendente seja físico ou não.

As bases poéticas e semânticas do amor são fascinantes e conforme o homem evolui, o entendimento sobre o tema também se amplia desde a ideia somente do amor entre um homem e uma mulher (olhar romântico) até o sentido transcendente onde envolve deuses e criaturas sagradas através de mitologias de civilizações antigas.

Conforme o homem cresce à nível cultural e adota escrituras, leituras e passa a viajar e ampliar suas concepções acerca da humanidade, seus sentimentos e emoções, o amor passa assume a posição de sentimento que mais motiva construções artísticas no mundo.

Da Antropologia, Psicologia até a Bioquímica, o amor desperta fascínios e intriga até hoje tanto os artistas quanto os cientistas.

O que seria o amor? Como podemos entender este sentimento que sempre esteve atrelado à evolução humana?

Se recorrermos ao bom e velho dicionário nos deparamos com muitos significados como grande afeição que une uma pessoa a outra ou a uma coisa, capricho, namoro, ato sexual, sentimento que leva uma pessoa a desejar o que lhe afigura belo, grandioso ou digno, etc.

Hoje em dia, já sabemos que sentir amor implica em estímulos nervosos, através dos estudos em neuroquímica.

Estar apaixonado implica num aumento ou diminuição de moléculas importantes de nosso organismo como os neurotransmissores, hormônios, minerais e vitaminas que são os responsáveis por sentimentos e comportamentos bem complexos.

Três neurotransmissores são o que mais tem relação com este sentimento: a dopamina, a serotonina e a norepinefrina. Além destes, hormônios como o estradiol, a progesterona e a testosterona comandam uma série de reações que despertam a atração, o desejo: é a chamada “química” entre o casal.

Uma das principais substâncias ligada à sensação de prazer, bem estar ou satisfação no nosso organismo é a Dopamina.

O álcool e outras drogas agem exatamente nos receptores desta molécula no cérebro. Daí a sensação de prazer que pode levar até a dependência química.

De acordo com esta informação podemos entender um pouco porque a pessoa apaixonada fica pensando tanto no ser amado esquecendo até mesmo algum defeito ou imperfeição desta pessoa que possa porventura até prejudica-la.

É o mesmo comportamento diante do vício em alguma droga. Quando afastado da droga (ou da pessoa amada) os sintomas de abstinência aparecem.

A Serotonina é outro neurotransmissor que tem relação com a paixão. Durante a fase de encantamento, os níveis de Serotonina diminuem ao contrário do que muita gente pensa. Justamente por diminuir a sensação de prazer é que surge o impulso por buscar o agente desencadeador desta sensação aumenta.

Por isso é comum algumas pessoas ficarem até obcecadas pela outra pessoa depois do término da relação. É a “abstinência” motivando impulsos e comportamentos imediatistas a fim de sanar o desconforto.

A Norepinefrina é o neurotransmissor que produz a sensação de alegria, excitação, falta de sono e a impressão de que o ser amado é único, especial sendo praticamente impossível compará-lo a outra pessoa.

A produção de energia aumenta assim como os batimentos cardíacos, atenção e energia vital bem típica daqueles que se mostram envolvidos recentemente com outra pessoa.

Mesmo sendo uma palavra simples e de fácil entendimento, explicar o amor já é outra estória.

Existe toda uma complexidade ao tentar explicar do se trata este sentimento que envolve aspectos fisiológicos, sociais, espirituais, sociais, pessoais e sociais de tantas formas diferentes.

Mas em se tratando do amor romântico, do apaixonar-se por outra pessoa, podemos entender o amor como uma entrega, um processo que começa pelo interesse em alguém seja pelo aspecto físico, jeito de ser e pensar ou outra particularidade que o faz se destacar dentre as demais pessoas.

Quando este interesse ou amor, afeto é retribuído, a paixão então passa a instigar comportamentos, pensamentos e ações particulares que visam manter o ser amado por perto por mais tempo.

Com o tempo, a atração, desejo, interesse passa a sofrer certa transformação e o amor em si, no sentido mais abrangente faz parte do dia a dia do casal.

Teoricamente seria assim que uma relação amorosa deveria funcionar não é mesmo?

Mas o que significa realmente amar alguém? Será que você está amando mesmo?

Devemos entender todo processo de amor como o que vimos lá no início do texto. O amor tem de contar com o sentido de doar-se. De se entregar em algum momento.

Amar realmente significa equilibrar e compartilhar expectativas. Construir metas e saber quando manter um ponto de vista e quando ceder por um benefício maior.

Amar de verdade é muito mais do que estar sempre feliz, alegre e distribuindo pequenos coraçõezinhos com o olhar.

Se existe o real ato de amar, está implícito aí ações como ouvir, confiar, dividir, ter paciência, enxergar o outro, aceitar. Isto nas duas pessoas envolvidas.

Assim como eu devo ceder eventualmente o outro também o faz a fim de manter a relação forte e satisfatória para os dois intercalando ganhos e perdas ao longo da convivência.

Perceber o outro, enxergar tanto as qualidades como defeitos e aceitar, negociar é que transforma a paixão e aquele encanto inicial em amor de fato.

Na infância nós ainda não sabíamos “trocar afeto”. Nós mais recebemos cuidados e fomos supridos em nossas necessidades do que o contrário.

Enquanto crianças não tínhamos a percepção de quando nossos pais precisavam descansar ou de momentos em que nossa mãe estava com dor de cabeça e precisava de uns momentos sozinha.

A criança ainda não desenvolveu esta consciência do cuidar do outro enquanto expressão de amor. Ela aprende tal comportamento aos poucos e na pré-adolescência a forma de amar começa a ficar mais ampla, mais empática.

Porém quando nos fixamos em comportamentos infantis, passamos a acreditar e a buscar pessoas que atendam nossos anseios e necessidades assim como nossos pais o faziam.

Então criamos uma ilusão de que o outro, o ser amado saberá do que nós precisamos, o que sentimos e como deve agir para nos atender porque quando criança é exatamente assim que vivemos em uma relação de afeto e amor.

Permanecer fixado em comportamentos egoístas (que só vive em função do ego buscando satisfazer somente as próprias necessidades) é o que provavelmente nos faz criar e manter relacionamentos frustrantes.

Aos poucos passamos a enxergar os relacionamentos afetivos como algo diferente do que aprendemos na infância.

Conforme nos relacionamos com pessoas de fora de nosso ambiente familiar, passamos a perceber a diversidade de sentimentos e emoções desencadeadas em reações que envolvem afeto. Sejam as relações de amor, sejam as de amizade, é na adolescência que a ilusão dos amores que nos suprem totalmente caem por terra.

As diferenças de criação, histórico familiar, crenças, hábitos e culturas irão nos proporcionar tanto a visão mais ampla acerca de como expressar amor quanto a frustração ao passar por situações normais de incompreensão ou atrito de comportamentos entre duas pessoas.

Este processo de aprender a amar nada mais é do que intercalar pedidos e ofertas de ajuda durante o relacionamento.

Quando percebemos que o outro precisa tanto quanto nós de quem ofereça amor, companheirismo, compreensão, começamos então a perceber este sentimento como agente de evolução mútua, onde duas pessoas crescem juntas em um caminho comum que percorrem ao longo da vida por determinado tempo.

Isto significa ter de deixar de lado nossos problemas ou sofrimentos para amparar o outro, engolir situações desagradáveis eventualmente buscando não desagradar ao outro ou abrir mão de gostos pessoais de vez em quando para atender aos anseios de quem eu escolhi para compartilhar fases de minha vida.

Tudo isso pautado em muito diálogo, em aprender a expressar sentimentos ao invés de esperar que o outro entenda o que você pensa ou anseia.

É aí que entra a importância de se valorizar e ter consciência de que todo relacionamento amoroso é uma troca, um compartilhamento.

Não existe relacionamento amoroso feliz o tempo todo sem desentendimentos.

Esta é uma ilusão que construímos na infância e não cabe mais na vida adulta.

A pessoa que eu amo não tem obrigação de corresponder a todos os meus anseios inclusive aos modelos de relacionamento ideal que eu criei em minha mente e o contrário também é válido.

Eu não tenho de me moldar de acordo com os anseios do outro.

Certamente que a pessoa que escolhi como parceiro vai gostar de umas características minhas e vai desgostar de outras. Isso é óbvio.

Se eu buscar me modificar sempre para agradar o outro viverei uma eterna saga de relacionamentos complicados, frustrantes ou até mesmo abusivos.

Tudo em matéria de relacionamento, seja de que ordem for, é questão de equilíbrio.

E por mais incrível que isto possa parecer, nós precisamos aprender a ser amados também.

Ser amado não é ser agradado o tempo todo.

Quando recebemos uma reprimenda de nossa mãe porque deixamos de estudar ou porque chegamos fora do horário, este ato é uma forma de amor.

Falar a verdade com consideração e respeito, discordar de algo que o outro diz ou não abaixar a cabeça para tudo que o outro diz é também forma de amor.

Sendo assim, quando o outro diz algo que eu não gosto eu preciso entender que isto pode ser a melhor expressão de amor essência.

Saber ser amado é saber enxergar amor nas atitudes do outro.

Se eu sou diabético e não posso comer doce, quem me ama vai sim ser chato e me lembrar de não comer aquele doce que eu tanto gosto.

Quem ama você se preocupa e vai tomar atitudes que vão lhe desagradar, mas certamente estas ações discordantes serão com o intuito de cuidar, preservar ou ajudar você.

Além disso, alguns comportamentos são sinais que podem lhe mostrar que você é amado, como por exemplo:

  • Se o parceiro pergunta (e ouve a resposta) sobre como foi seu dia, o que você fez;

  • Você percebe que ele gosta de ficar em sua cia e vez por outra prefere desmarcar outro compromisso para ter sua presença ao lado dele;

  • Se ele mostra confiança e sabe que você o trata com respeito sem ficar cobrando atitudes de fidelidade o tempo todo;

  • Respeita se você tem uma opinião diferente e não fica sempre discutindo para ter razão;

  • Oferece ajuda com frequência seja no seu trabalho profissional, seja com as tarefas em casa;

  • Na hora de decidir algo ele sempre inclui o seu ponto de vista e pede sua opinião;

  • Ele expressa carinho através do toque por mais singelo que seja como andar de mãos dadas, por exemplo;

  • Ele estimula seu crescimento profissional ou pessoal incentivando você a se aprimorar, estudar ou algo do tipo.

Estes são apenas alguns sinais que são comuns de se observar dentro do relacionamento quando existe amor.

Expressar o amor é outro ponto que deve ser considerado com muito carinho.

Muitas pessoas não conseguem falar, verbalizar que ama o outro.

Elas preferem demonstrar amor.

Não é motivo para brigas quando você diz “eu te amo” e o outro não o faz com tanta frequência.

Pode ser que no ambiente familiar a pessoa não tenha aprendido a falar sobre os sentimentos mais abertamente.

Nem sempre o verbalizar, dizer que gosta é incentivado nas famílias.

Mas quando a pessoa gosta, ela vai expressar isso seja ao passar na padaria e viu o bombom que você gosta e o trouxe para você, seja lhe cobrindo à noite para você não sentir frio, seja deixando de descansar no domingo para poder fazer aquela caminhada que você andou pedindo faz um tempo…

Amar é saber ler o outro através dos comportamentos dele.

Nem sempre estaremos num bom dia. Passaremos por dias e fases difíceis e se o outro estiver com a cara fechada e mais calado, precisamos entender que isto é o jeito dele e nada tem a ver conosco.

E o contrário é válido também.

Quando existe amor de verdade, dizer que o dia foi ruim e querer ficar sozinho e quieto no canto não é sinal de desamor.

O poeta Mario Quintana dizia o que a amizade é quando o silêncio a dois não se torna incômodo. Amor é quando o silêncio a dois se torna cômodo.

É exatamente assim.

Quando o amor está instalado na relação a dois, existe uma sensação de aconchego na companhia do outro.

É prazeroso ficar perto nem que seja para ficar em silêncio.

Se o relacionamento nos deixa preocupado, tenso, desconfiado o tempo todo é sinal que algo está ocupando o lugar que deveria ser do amor. Seja mágoa, raiva ou medo, se no relacionamento o prazer de ficar junto já não é mais constante, é hora de sentar e dialogar a dois.

Cumplicidade e companheirismo são as bases de uma relação amorosa.

A paixão e as extravagâncias fazem parte do ritual de conquista e sedução. O amor mesmo, em sua essência, é um movimento constante de ternura, cuidado e admiração mútua com episódios mais ou menos constantes de paixão e intensidade.

Fato é que as dúvidas sobre o amor, seu significado e sua importância são temas constantes na humanidade desde que o ser humano passou a olhar nos olhos um do outro.

Á partir do momento em que o homo sapiens se ergue e olha o parceiro de igual para igual, é aí que o sentimento amor começa a tomar forma e percorre um infinito caminho de descobertas e percepções.

Não é fácil amar ou ser amado. Nós estamos aprendendo constantemente e certamente iremos falhar e nos deparar com falhas do outro também.

Não se trata de ter um relacionamento perfeito, como o que as pessoas tentam mostrar em redes sociais ou empresas vendem em suas campanhas publicitárias e filmes.

A arte do amor está em justamente aceitar a si e ao outro com todo o seu conjunto de características, manias, qualidades, defeitos e tudo o mais que integra o universo do ser amado.

Por isso, antes de oferecer o seu amor à alguém, aprenda também a identificar e cultivar o amor que com certeza o fará dar passos firmes na direção de um relacionamento feliz: cultive o amor próprio para aí sim, receber e compartilhar o amor em seu sentido real e transcendente ao mesmo tempo.